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Havendo uma tristeza armada em mim. Ela veste uma armadura, empunha espada e escudo, pronta a lutar contra qualquer coisa que deseje meu sorriso.

Arrumo meu prato de almoço, retiro a cadeira da mesa em que sentará a família para almoçar. Coloco a cadeira do lado de fora da casa, sob o sol. Minha mãe perguntando enquanto concentrada em temperar a salada:

­_ Tá com frio, filha?

Respondo rápido (com a mesma certeza que a palavra amém carrega). Eu respondendo com voz clara e firme e séria… respondendo.

E, quero dizer, minha mãe perguntando:

_ Tá com frio, filha?

Eu respondendo:

_ Sempre.

A Reza

Unir as palmas das mãos frente ao rosto, baixar respeitosamente a cabeça.

Fechar os olhos e pedir baixinho:

– Que eu pise, com o dedão do pé, no limite da sanidade. Amém.

Fazer o sinal da cruz.

Ah menina, não te engane por esses desenhos nos muros, de uma criança empinando uma pipa, mas na verdade é

a pipa que empina a criança e ela nem percebe isso!

Vê aquele homem correndo verticalmente em direção ao sol,

sem conseguir conter a náusea? A vida o deixou assim;

chorando a inocência dos monstros, sentindo a cartilagem dos feridos…

Agora o chamam de louco. Idiotas! Não vêem que ele

está a fazer poesia…

Falar-te de flores? Como? Se as que plantei

nem me lembro onde para poder colhê-las?

Vê em mim essas marcas de vinho tinto?

é assim que escrevo um livro pois

roubaram me a biblioteca, caverna de palavras

puras onde minavam meus versos.

Ah, menina não fique assim como eu,

brinque zombando de tudo que ainda há tempo,

porque não terás rumo e tua bussola será

os braços cansados dos remos.

Arrebenta os cadeados dos parques fechados

E anda de bicicleta com o moleque triste

Que te observa do lado de fora da grade

não seja assim como ele, e que nunca

te vejam cavando trincheiras nos

olhos quando a saudade chega

Vá, enterre os ossos das asas

que morreram na primavera.

Endureça seu coração, marca em brasa

a veia líquida do amor e sigas em frente.

Amadureça que nem bicho e foge para as matas

mas não deixa que te cacem, enquanto fruto

mantenha-se verde, porque se te colherem só valerás

prá eles o tempo de enfeitares a fruteira…

Fere  o rosto do outono com o bisturi do vento

e farás com que as estações desgarrem-se de ti pouco a pouco.

Vá menina, que o tempo afogará teus bons momentos

na palidez do nunca mais. Parta agora

E de bagagem, só o sorriso da boneca de pano que

sempre será o mesmo, a cortina dançarina da sala, as

cirandas que não se romperam e o amigo que cavou

dentro dos olhos o poço da tua ausência

Nada mais, além disso, porque pesam muito as lembranças…

Vá embora logo, suma da minha frente! (antes que

eu me arrependa e te peça pra ficar)

Porque da minha parte não haverá verso nem prosa,

não haverá dedicatória, nem dor, nem lágrima,

nem aceno, sem colo.

Prá que não fique assim tão tola como eu agora

deixando que a vida pareça um grande oceano

e eu só tenha essa gota de sal pra te ofertar

Presa nos olhos.

Maria de Fátima Cruz, 2006

Antônio. Querido.

Como senti-me (não sozinha; mas sem sua mão que.) ponderei que era momento de fazer um bonequinho de você. Poderia usar minha pele como pano para costurar o boneco. Mas, de longe, minha pele não tem em nada o mesmo tom (a mesma cores) que a sua.

Optei, já era momento (pois eu nem tão sozinha; mas eu sem poder te.), de fazer um boneco de você. E minha pele não poderia servir como pano. Não pense que eu tinha medo da dor de ma-arranca-la, pois essa dor não se compara a este meu rancor (mudo). A dor de ma-arranca-la não se compara ao vazio (desvairodasuamão: na  parte de trás da minha coxa, empurrando minha perna pra cima, pra cima) da sua falta. Costurei o boneco com uns retalhos de mundo e peguei um punhado do céu que se reflete n’água d’um rio (dubiedade entre o verde e o azul) e coloquei nos olhos do boneco, para imitar a cor dos seus.

Pra fazer o boneco de você minha pele não serviria. E, talvez, o que me choca e me destrói-de-paixão é você ser-me o oposto. Peguei o punhado de céu refletido n’água e fiz os olhos do teu (meu) boneco e, sentada no chão do quarto, com as costas apoiadas na lateral da cama, pedi ao bonequinho:

 – Sorria pra mim.

Chacoalhei o boneco, com um desespero meio disfarçado. Pedi três vezes, pedi cinco, pedi dezessete vezes:

 – Sorria pra mim.

Em alguma delas acrescentei um desonroso por-favor. Sorria pra mim, por-favor.

E você, querido olhos-verdes-azuis-água, oposto (em tudo) de mim – de paragens tão longes terá sentido a doçura dessa macumba? Hein?